Corrente no WhatsApp usa dados errados para criticar impostos

Corrente no WhatsApp usa dados errados para criticar impostos

Da Agência Pública “Os 10 países onde MAIS se trabalhou em um ano para pagar impostos: 1. Brasil: 2.600 horas (é mais que o dobro do 2º colocado!) 2. Bolívia: 1.080 horas 3. Vietnã: 941 horas 4. Nigéria: 938 horas 5. Venezuela: 864 horas 6. Bielorrússia: 798 horas 7. Chade: 732 horas 8. […]

“Os 10 países onde MAIS se trabalhou em um ano para pagar impostos:

1. Brasil: 2.600 horas (é mais que o dobro do 2º colocado!)

2. Bolívia: 1.080 horas

3. Vietnã: 941 horas

4. Nigéria: 938 horas

5. Venezuela: 864 horas

6. Bielorrússia: 798 horas

7. Chade: 732 horas

8. Mauritânia: 696 horas

9. Senegal: 666 horas

10. Ucrânia: 657 horas

Fonte: Banco Mundial

“O Brasil tem a maior carga tributária do mundo, para pagar a MAIOR CORRUPÇÃO DO MUNDO”

Tributos no Brasil – uma vergonha!!!

Medicamentos      36%

Luz                   45,81%

Telefone            47,87%

Gasolina            57,03%

Cigarro              81,68%

PRODUTOS ALIMENTÍCIOS BÁSICOS

Carne bovina       18,63%

Frango                 17,91%

Peixe                   18,02%

Sal                       29,48%

Trigo                    34,47%

Arroz                    18,00%

Óleo de soja        37,18%

Farinha                34,47%

Feijão                  18,00%

Açúcar                40,40%

Leite                    33,63%

Café                    36,52%

Macarrão            35,20%

Margarina            37,18%

Molho tomate      36,66%

Biscoito               38,50%

Chocolate            32,00%

Ovos                    21,79%

Frutas                  22,98%

Álcool                  43,28%

Detergente           40,50%

Sabão em pó      42,27%

Desinfetante        37,84%

Água sanitária     37,84%

Esponja de aço   44,35%

PRODUTOS BÁSICOS DE HIGIENE

Sabonete                 42%

Xampu                 52,35%

Condicionador    47,01%

Desodorante       47,25%

Papel Higiênico   40,50%

Pasta de Dente   42,00%

MATERIAL ESCOLAR

Caneta                48,69%

Lápis                   36,19%

Borracha             44,39%

Estojo                  41,53%

Pastas plásticas  41,17%

Agenda                44,39%

Papel sulfite         38,97%

Livros                   13,18%

Papel                   38,97%

BEBIDAS

Refresco em pó   38,32%

Suco                    37,84%

Água                    45,11%

Cerveja                56,00%

Cachaça              83,07%

Refrigerante        47,00%

Sapatos               37,37%

Roupas                37,84%

Computador        38,00%

Telefone Celular   41,00%

Ventilador            43,16%

Liquidificador      43,64%

Refrigerador        47,06%

Microondas         56,99%

Tijolo                    34,23%

Telha                    34,47%

Móveis                 37,56%

Tinta                    45,77%

Casa popular       49,02%

Mensalidade Escolar 37,68% (ISS DE 5%)

ALÉM DESTES IMPOSTOS, VOCÊ PAGA

– DE 15% A 27,5% DO SEU SALÁRIO A TÍTULO DE IMPOSTO DE RENDA;

– PAGA O SEU PLANO DE SAÚDE,

– O COLÉGIO DOS SEUS FILHOS,

– IPVA,

– IPTU,

– INSS,

– FGTS

– ETC.

DIVULGUE !”

Uma longa mensagem com críticas aos impostos cobrados no Brasil tem circulado pelo aplicativo WhatsApp e aparecido também em páginas no Facebook. Apesar de o texto trazer algumas variações, a corrente tenta provar que “o Brasil tem a maior carga tributária do mundo”. O conteúdo lista as taxas supostamente cobradas em produtos diversos e também faz um ranking com os dez países onde mais se trabalharia para pagar tributos. Argumentos como esses têm servido para contestar o valor dos impostos no país, classificados como muito altos diante da qualidade dos serviços públicos oferecidos.

Truco – projeto de checagem da Agência Pública – procurou a origem dos números citados, com o objetivo de analisar a veracidade da mensagem. A reportagem concluiu que a maioria dos dados está errada. Por isso, a corrente foi classificada como falsa. A autoria do texto é desconhecida, ou seja, não é atribuída a nenhum tipo de grupo ou organização. O Banco Mundial, contudo, aparece como fonte de alguns dos números usados.

A reportagem entrou em contato com a sede do Banco Mundial no Brasil para verificar o envolvimento da organização com o ranking que inicia a corrente. A entidade afirma não ter lançado nenhum estudo específico sobre o tempo que uma pessoa gasta trabalhando para pagar seus impostos recentemente. O Truco localizou, no entanto, um estudo da empresa de consultoria PwC feito em parceria com o Banco Mundial em 2015. Nesse documento aparece o dado de 2.600 horas trabalhadas para pagamento de impostos. No entanto, o número é relativo à quantidade de horas empregadas por uma empresa para o pagamento de tributos no ano de 2013. Assim, o número não se refere às horas trabalhadas pelo cidadão para o pagamento de tributos, como sugere a corrente. Trata-se de uma estimativa do gasto anual das empresas com impostos.

Além disso, o ranking citado está desatualizado, uma vez que a PwC já divulgou a edição de 2016 do estudo. O Truco verificou o total de horas empregadas pelas empresas no pagamento de impostos nos dez países citados pela corrente, utilizando o relatório mais recente da PwC, publicado no ano passado e baseado em dados de 2014. Dos dez números indicados na mensagem, apenas um está correto: o total de horas empregadas com tributos no Chade. Veja, nas tabelas a seguir, os números indicados pela corrente e os valores atualizados de acordo com o relatório.

Ranking original da mensagem –

“Os 10 países onde MAIS se trabalhou em um ano para pagar impostos”

País

Total de horas

Posição

Brasil

2.600

1

Bolívia

1.080

2

Vietnã

941

3

Nigéria

938

4

Venezuela

864

5

Belarus

798

6

Chade

732

7

Mauritânia

696

8

Senegal

666

9

Ucrânia

657

10

Fonte: Mensagem do WhatsApp

Tabela segundo a PwC –

Número de horas empregadas no pagamento de tributos por empresas no mundo

País

Total de horas

Posição

Brasil

2600

1

Bolívia

1025

2

Vietnã

770

6

Nigéria

908

3

Venezuela

792

5

Belarus

176

Não consta nas 10 primeiras posições

Chade

732

8

Mauritânia

734

7

Senegal

620

10

Ucrânia

350

Não consta nas 10 primeiras posições

Fonte: Relatório Paying Taxes 2016 da PwC

Outras acusações

A mensagem alega ainda que “o Brasil tem a maior carga tributária do mundo”. No entanto, a afirmação é falsa. De acordo com o mesmo relatório da PwC, a carga tributária para as empresas no Brasil fica em torno de 69,2% – esse porcentual representa o Índice Total de Impostos, dado calculado pelo estudo para cada país analisado. O número é muito inferior ao adotado por países como a Argentina, com tributação de 137%, e Eritreia e Bolívia, com tributação de 83% cada. Também é inferior ao da Colômbia, com 69,7%, e muito próximo da porcentagem de países europeus desenvolvidos, como a Itália, onde a taxa é de 64,8%, e da França, com 62,7%.

Portanto, o Brasil não é o país com a mais alta carga tributária do mundo, como afirma a mensagem. Na verdade, o país que tem a maior carga tributária do mundo é Comores, pequena república insular no Oceano Índico, onde a porcentagem é de 216%, segundo o estudo da PwC.

Também está errado dizer que a carga tributária serve para pagar “a maior corrupção do mundo”. De acordo com o Índice de Percepção de Corrupção de 2016, elaborado pela Transparência Internacional, o Brasil ocupa o 79º lugar entre 176 países. Está localizado no meio do ranking, com 40 pontos, igualmente distante tanto dos primeiros como dos últimos colocados. No levantamento de 2015, o país somou 38 pontos e ocupou o 69º lugar (quanto menor a pontuação, maior é a corrupção percebida). Logo, o Brasil está longe de ser o país mais corrupto do mundo.

Outro trecho incorreto da corrente é o que alega que “de 15% a 27,5%” do salário do brasileiro é destinado ao Imposto de Renda. Na verdade, a menor faixa do IR no Brasil é de 7,5%. Esta alíquota incide sobre rendimentos até R$ 2.826,65 mensais. Quem ganha menos do que isso está isento.

Logo depois, a mensagem informa ainda que o brasileiro se compromete com outras despesas como plano de saúde, mensalidade escolar, IPVA, IPTU, INSS e FGTS. No entanto, essas contribuições são facultativas, vinculadas à propriedade de um bem, como imóvel ou veículo, ou pagas apenas por aqueles que contratam funcionários, o que demonstra outro erro.

Carga tributária dos produtos

Em outra parte, a mensagem compartilhada no WhatsApp lista diversos produtos e a carga tributária que incidiria sobre eles no Brasil. O Truco entrou em contato com o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) para verificar os números indicados na mensagem. O instituto é reconhecido por estudar, desde sua criação, em 1992, o impacto dos tributos na atividade empresarial brasileira.

A tabela abaixo mostra a carga tributária de cada produto segundo a corrente de WhatsApp e o valor apurado pelo IBPT, atualizado em junho de 2017. Dos 60 produtos incluídos na mensagem viral, nenhum estava com a porcentagem igual à indicada pelo instituto.

PRODUTO

CARGA TRIBUTÁRIA SEGUNDO A CORRENTE

CARGA TRIBUTÁRIA SEGUNDO IBPT

Carne bovina

18,63%

17,47%

Frango

17,91%

16,80%

Peixe

18,02%

34,48%

Sal

29,48%

15,05%

Trigo

34,47%

17,34%

Arroz

18,00%

17,24%

Óleo de soja

37,18%

26,05%

Farinha

34,47%

17,34%

Feijão

18,00%

17,24%

Açúcar

40,40%

30,60%

Leite

33,63%

18,65%

Café

36,52%

19,98%

Macarrão

35,20%

16,30%

Margarina

37,18%

35,98%

Molho tomate

36,66%

36,05%

Biscoito

38,50%

37,30%

Chocolate

32,00%

38,60%

Ovos

21,79%

20,59%

Frutas

22,98%

21,78%

Álcool

43,28%

32,77%

Detergente

40,50%

30,37%

Sabão em pó

42,27%

40,80%

Desinfetante

37,84%

26,05%

Água sanitária

37,84%

26,05%

Esponja de aço

44,35%

40,62%

Sabonete

42%

37,09%

Xampu

52,35%

44,20%

Condicionador

47,01%

37,37%

Desodorante

47,25%

37,37%

Papel Higiênico

40,50%

39,94%

Pasta de Dente

42,00%

34,67%

Caneta

48,69%

47,49%

Lápis

36,19%

34,99%

Borracha

44,39%

43,19%

Estojo

41,53%

40,33%

Pastas plásticas

41,17%

40,09%

Agenda

44,39%

43,19%

Papel sulfite

38,97%

37,77%

Livros

13,18%

15,52%

Papel

38,97%

Não consta

Refresco em pó

38,32%

36,30%

Suco

37,84%

36,21%

Água

45,11%

45,55%

Cerveja

56,00%

55,60%

Cachaça

83,07%

81,87%

Refrigerante

47,00%

46,47%

Sapatos

37,37%

36,17%

Roupas

37,84%

34,67%

Computador

38,00%

33,62%

Telefone Celular

41,00%

39,80%

Ventilador

43,16%

34,30%

Liquidificador

43,64%

43,54%

Refrigerador

47,06%

36,98%

Microondas

56,99%

54,98%

Tijolo

34,23%

34,17%

Telha

34,47%

33,95%

Móveis

37,56%

Não consta

Tinta

45,77%

36,17%

Casa popular

49,02%

48,30%

Mensalidade Escolar

37,68%

26,32%

Fonte: IBPT

Apesar de nenhum dos dados de carga tributária indicados pela corrente estar correto, de acordo com os últimos levantamentos do IBPT, muitos deles chegam perto dos indicados pelo instituto, o que demonstra que a origem da corrente pode ser um compilado de dados desatualizados. Dois produtos genéricos citados na corrente, papel e móveis, não constam na apuração do IBPT.

Conclusão

Não foi possível localizar a origem de todos os dados indicados na mensagem que se espalhou pelo WhatsApp. No entanto, fontes como PwC e IBPT mostram erros nos números citados na corrente. Além disso, a mensagem inclui informações incorretas acerca do Imposto de Renda, da carga tributária brasileira e do nível de corrupção em relação a outros países do mundo. Diante das evidências encontradas pelo Truco, a corrente foi classificada como falsa, já que a análise dos dados e de outras fontes comprova diversos erros do texto.

 

 

Por Ultima Hora em 16/04/2024
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